No lugar da cassação, parlamentares julgados no Conselho de Ética da Câmara poderão ser punidos com penas alternativas, como suspensões ou censuras provisórias. Em vez de multas, produtores e fazendeiros que desmataram ilegalmente áreas de proteção ambiental poderão ter seus delitos perdoados. E, nos tribunais e varas criminais, as prisões em flagrante e os pedidos de prisões preventivas poderão ser substituídos por medidas cautelares, como a proibição de frequentar determinados lugares ou o recolhimento durante a noite. Essas três mudanças foram aprovadas no mês passado no Congresso e tornam punições previstas na lei menos rigorosas.
No Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Lei Ficha Limpa não vale para as eleições do ano passado e está para decidir se a inelegibilidade poderá retroceder para punir condenados antes da entrada em vigor da legislação. Tentativas de prefeitos para amenizar as penas previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal são recorrentes.
O abrandamento das penas para superar problemas estruturais do sistema prisional e contornar a falta de fiscalização do Poder Público é visto como incentivo à impunidade no meio jurídico e até entre parlamentares que aprovaram as mudanças.
Aprovada em abril pelos deputados federais e sancionada no início de maio pela presidente Dilma Rousseff (PT), a Lei n° 12.403/2011, que revê o Código Penal, está no rol das que dão uma colher de chá ao acusados de crimes. Entre as novas regras está a restrição da prisão em flagrante e substituição da prisão preventiva pelas medidas cautelares. As novas regras se aplicam a acusados de crimes considerados menos graves — como furto, porte ilegal de arma, homicídio culposo (sem intenção de matar), lesão corporal e receptação — para evitar a superlotação das cadeias e, segundo o Ministério da Justiça, permitem que o juiz avalie se o acusado é ou não perigoso para a sociedade.
Nova York
O promotor de Justiça do Paraná Giovani Ferri — que divulgou manifesto contrário à lei — acredita que o resultado será o aumento de impunidade para criminosos. “Trabalho na área criminal há 15 anos e fiquei extremamente desanimado com a nova lei. Na prática, essas mudanças serão um desastre, não se assuste se encontrar na rua o assaltante que entrou armado, o ladrão que roubou seu carro, o bandido que estava circulando com arma de fogo ou o criminoso que desviou milhões de reais dos cofres públicos. Serão garantidas para crimes como esses as medidas cautelares, que o Estado não tem como fiscalizar efetivamente. Percebo no Brasil uma inversão de valores totalmente contrária ao que desejamos”, afirma Giovani.
O promotor cita exemplos de adoção de medidas opostas que levaram a bons resultados. “Temos os casos de Nova York e Bogotá, que viviam situações difíceis no combate ao crime e adotaram regimes de tolerância zero, conseguindo ótimos resultados. É uma decepção saber que a lei foi aprovada no Congresso. Vamos pagar caro por ela”, diz.
Já para o professor de direito penal da PUC Minas Maurício Campos, o abrandamento da legislação não deve ser visto como um atraso. Segundo ele, a lei é um recado ao sistema judiciário, determinando que as punições aplicadas pelos tribunais devem ser acompanhadas de sentenças definitivas.
Apesar de aprovada na Câmara, a lei recebeu críticas dos parlamentares. O vice-presidente da Comissão de Segurança-Pública, deputado Fernando Francischini (PSDB-PR), considera a medida cautelar um dificultador para a ação policial. “Diminuímos a capacidade de atuar em flagrante que a polícia pode fazer. Quando cheguei à comissão, o projeto já tinha passado. Até tentamos rever a lei antes de ser sancionada, mas não deu. Infelizmente, o Congresso legisla em causa própria em alguns temas. E com muitos parlamentares respondendo a processos, a proposta foi bem aceita e houve retrocesso no Código Penal”, lamentou.
Ficha limpa
Duas leis que podem ser decisivas para o futuro do país estão na corda bamba. No campo da política, a Ficha Limpa, projeto de origem popular que contou com o apoio de 1,6 milhão de eleitores, que barra a candidatura de políticos condenados na Justiça, pode sofrer um revés. Sua retroatividade está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) e ainda há dúvida se ela poderá ou não ser aplicada para pessoas condenadas antes de sua entrada em vigor. Para dirimir toda dúvida, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com ação direta de constitucionalidade para garantir que a lei seja aplicada nas eleições municipais do ano que vem e que alcance todos os condenados.
Na área ambiental, para a qual se voltam os olhos de todo o mundo, a impunidade também aparece entre as novas regras do Código Florestal, aprovadas por ampla maioria na Câmara dos Deputados. A anistia a produtores que desmataram até 2008 é o ponto nevrálgico do texto aprovado e está na mira dos ambientalistas e do governo federal, defensor de regras mais rígidas que as aprovadas pela Câmara.
Ética
Há duas semanas, foram aprovadas mudanças no regulamento do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados que permitem a recomendação de penas alternativas aos parlamentares que receberem pedidos de cassação. A nova regra garante a adoção de penalidades mais brandas, como suspensão de prerrogativas na Casa para discursar em plenário ou relatar projetos. A votação do novo regulamento furou a fila de projetos que tramitavam na Casa e previam ampliar o enquadramento como quebra de decoro parlamentar.
“Caso o Conselho não continue agindo de maneira corporativa como agiu até hoje, podemos até ter resultados positivos com as mudanças, já que a divulgação de penas, mesmo que mais brandas, pode marcar a carreira dos políticos”, opina o cientista político Malco Camargos.
Para o presidente do Conselho de Ética da Casa, deputado José Carlos Araújo (PDT-BA), as críticas que as novas regras receberam não fazem sentido. Para ele, a perda dos direitos políticos é uma medida extrema e, por isso, mais difícil de ser adotada. “Muitas vezes tivemos parlamentares que não receberam qualquer punição no Conselho só porque a cassação era uma pena excessiva para o parlamentar. As mudanças vão permitir que punições aconteçam, mesmo que sejam menores”, argumenta o deputado.
Marcelo da Fonseca
Colaboração:
No Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Lei Ficha Limpa não vale para as eleições do ano passado e está para decidir se a inelegibilidade poderá retroceder para punir condenados antes da entrada em vigor da legislação. Tentativas de prefeitos para amenizar as penas previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal são recorrentes.
O abrandamento das penas para superar problemas estruturais do sistema prisional e contornar a falta de fiscalização do Poder Público é visto como incentivo à impunidade no meio jurídico e até entre parlamentares que aprovaram as mudanças.
Aprovada em abril pelos deputados federais e sancionada no início de maio pela presidente Dilma Rousseff (PT), a Lei n° 12.403/2011, que revê o Código Penal, está no rol das que dão uma colher de chá ao acusados de crimes. Entre as novas regras está a restrição da prisão em flagrante e substituição da prisão preventiva pelas medidas cautelares. As novas regras se aplicam a acusados de crimes considerados menos graves — como furto, porte ilegal de arma, homicídio culposo (sem intenção de matar), lesão corporal e receptação — para evitar a superlotação das cadeias e, segundo o Ministério da Justiça, permitem que o juiz avalie se o acusado é ou não perigoso para a sociedade.
Nova York
O promotor de Justiça do Paraná Giovani Ferri — que divulgou manifesto contrário à lei — acredita que o resultado será o aumento de impunidade para criminosos. “Trabalho na área criminal há 15 anos e fiquei extremamente desanimado com a nova lei. Na prática, essas mudanças serão um desastre, não se assuste se encontrar na rua o assaltante que entrou armado, o ladrão que roubou seu carro, o bandido que estava circulando com arma de fogo ou o criminoso que desviou milhões de reais dos cofres públicos. Serão garantidas para crimes como esses as medidas cautelares, que o Estado não tem como fiscalizar efetivamente. Percebo no Brasil uma inversão de valores totalmente contrária ao que desejamos”, afirma Giovani.
O promotor cita exemplos de adoção de medidas opostas que levaram a bons resultados. “Temos os casos de Nova York e Bogotá, que viviam situações difíceis no combate ao crime e adotaram regimes de tolerância zero, conseguindo ótimos resultados. É uma decepção saber que a lei foi aprovada no Congresso. Vamos pagar caro por ela”, diz.
Já para o professor de direito penal da PUC Minas Maurício Campos, o abrandamento da legislação não deve ser visto como um atraso. Segundo ele, a lei é um recado ao sistema judiciário, determinando que as punições aplicadas pelos tribunais devem ser acompanhadas de sentenças definitivas.
Apesar de aprovada na Câmara, a lei recebeu críticas dos parlamentares. O vice-presidente da Comissão de Segurança-Pública, deputado Fernando Francischini (PSDB-PR), considera a medida cautelar um dificultador para a ação policial. “Diminuímos a capacidade de atuar em flagrante que a polícia pode fazer. Quando cheguei à comissão, o projeto já tinha passado. Até tentamos rever a lei antes de ser sancionada, mas não deu. Infelizmente, o Congresso legisla em causa própria em alguns temas. E com muitos parlamentares respondendo a processos, a proposta foi bem aceita e houve retrocesso no Código Penal”, lamentou.
Ficha limpa
Duas leis que podem ser decisivas para o futuro do país estão na corda bamba. No campo da política, a Ficha Limpa, projeto de origem popular que contou com o apoio de 1,6 milhão de eleitores, que barra a candidatura de políticos condenados na Justiça, pode sofrer um revés. Sua retroatividade está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) e ainda há dúvida se ela poderá ou não ser aplicada para pessoas condenadas antes de sua entrada em vigor. Para dirimir toda dúvida, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com ação direta de constitucionalidade para garantir que a lei seja aplicada nas eleições municipais do ano que vem e que alcance todos os condenados.
Na área ambiental, para a qual se voltam os olhos de todo o mundo, a impunidade também aparece entre as novas regras do Código Florestal, aprovadas por ampla maioria na Câmara dos Deputados. A anistia a produtores que desmataram até 2008 é o ponto nevrálgico do texto aprovado e está na mira dos ambientalistas e do governo federal, defensor de regras mais rígidas que as aprovadas pela Câmara.
Ética
Há duas semanas, foram aprovadas mudanças no regulamento do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados que permitem a recomendação de penas alternativas aos parlamentares que receberem pedidos de cassação. A nova regra garante a adoção de penalidades mais brandas, como suspensão de prerrogativas na Casa para discursar em plenário ou relatar projetos. A votação do novo regulamento furou a fila de projetos que tramitavam na Casa e previam ampliar o enquadramento como quebra de decoro parlamentar.
“Caso o Conselho não continue agindo de maneira corporativa como agiu até hoje, podemos até ter resultados positivos com as mudanças, já que a divulgação de penas, mesmo que mais brandas, pode marcar a carreira dos políticos”, opina o cientista político Malco Camargos.
Para o presidente do Conselho de Ética da Casa, deputado José Carlos Araújo (PDT-BA), as críticas que as novas regras receberam não fazem sentido. Para ele, a perda dos direitos políticos é uma medida extrema e, por isso, mais difícil de ser adotada. “Muitas vezes tivemos parlamentares que não receberam qualquer punição no Conselho só porque a cassação era uma pena excessiva para o parlamentar. As mudanças vão permitir que punições aconteçam, mesmo que sejam menores”, argumenta o deputado.
Marcelo da Fonseca
Colaboração:
GUMERCINDO MUNI ADVOGADOS
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